Os anos que antecederam
ao fim da ditadura Duvalierista foram marcados pelo crescimento do
descontentamento de diversos grupos opositores. A burguesia, insatisfeita com a
crise econômica, com a ineficácia política e com as vantagens de todos os tipos
oferecidas ao clã Bennett – em virtude de sua ligação com Baby Doc –, não
conseguiu organizar-se através de uma liderança forte. O esvaziamento ideológico
de partidos e sindicatos por Franções Duvalier deixou uma ausência de
lideranças entre os burgueses. O mesmo se passava com a pequena burguesia
urbana. Engrossavam o grupo de opositores, mas sem uma liderança específica.
Nesta conjuntura, o
clero católico do Haiti terá grande papel no processo que levaria ao fim a
ditadura. As atividades desenvolvidas pelo clero, com base no Concílio Vaticano
II, correspondiam as aspirações populares: igualdade, justiça social, etc. A
visita do papa João Paulo II ao Haiti em 1983 contribuiu para este despertar do
clero, que passou a organizar os protestos. O rádio passa a ser amplamente
utilizado como veículo de comunicação das insatisfações populares. Os diversos
grupos opositores, heterogênicos e com distintas aspirações derrubaram a
ditadura outrora intocável:
Pierre-Charles sostiene que, hoy por hoy, el elemento
central de identidad política del pueblo haitiano es simple y precario: el
rechazo al régimen. En este planteo mínimo coinciden desde los sectores más
radicalizados (que visualizan la superación del régimen por el desarrollo de un
proceso de luchas que desembocarían em la creación de un Estado socialista)
hasta la derecha de inspiración democrática li-beral, que está por la
modernización del país, passando por los grupos reformistas, con lecturas
y propuestas diversas que apenas coinciden entre sí en la
necesidad de establecer algún
tipo racional y
civilizado de institucionalidad (...)[1]
A participação popular
também foi intensa. Desde o campesinato das províncias distantes – o que
obrigava os Tontons Macoutes a saírem da capital Porto Príncipe – até
estudantes. A reação da polícia de Baby Doc foi violenta:
HAÏTI : TROIS
COLLÉGIENS ABATTUS
De graves incidents
survenus le 28 novembre 1985 témoignent du climat politique de tension
croissante (...) Ce jour-là deux collégiens étaient abattus par balles et un
autre frappé à mort à l'intérieur d'établissements sco laires, à l'occasion de
manifestations d'opposition se déroulant dans les rues voisines. L'assassinat
délibéré du jeune Jean-Robert Cius est en réalité un aver tissement adressé
aux prêtres qui mobilisent la jeunesse, comme lors du Concile des jeunes
d'Haiti (...) Gonaïves, ce 28 novembre 1985 Emmanuel Constant Evêque des Gonaïves[2]
Uma marcha da juventude
em Gonaives – conhecida como cidade da independência, pois foi aí que
Jean-Jacques Dessalines proclamou a independência em 1802 –, realizada em 28 de
novembro de 1985, duramente reprimida pela polícia resultou na morte de três
estudantes. Este fato é considerado como o estopim para o início da onda de
manifestações pelo país que culminaram com o fim da ditadura.
The immediate cause of this outrage was the shooting
of three teenagers on november 28, 1985, and the ensuing wave of arrests and
beating of Gonaives dissidents. Jean Cobert Cuis, Mackenson Michel, and Daniel
Israel, the three students murdered by Duvaliers security forces, became
martyres to the struggle for dignity and freedom. Their deaths unleashed a nex
symbolic repertoire of contestation and determined popular resistance. Indeed,
for the first time, during these Gonaives demonstrations Jean Claude Duvalier
himself was personally directly as an "assassin"
who had to go.[3]
Em dezembro, cerca de
350 mães de família de diferentes partes do país realizam uma manifestação em
solidariedade as mães dos três estudantes assassinados. Baby Doc viu eclodir
manifestações por todo o país e passou a ser pressionado pelo presidente dos
Estados Unidos Ronald Reagan. Isolado, Baby Doc decide abandonar o governo. Em
07 de fevereiro de 1986, declarando: “salgo com la cabeza erguida... dejo el poder
a los militares”.[4]
Samuel Cassiano - estudante do Curso de História - América Latina, da UNILA.
[1] “Haití: la procesión va por dentro.” NUEVA SOCIEDAD NRO. 41
MARZO-ABRIL 1979, PP. 129-134. (Entrevista de Gerard Pierre Charles, politólogo
haitiano e dirigente da resistência antiduvalierista).
[2]
Diffusion de l’information sur l’Amérique latine DIAL n°1076. PARIS (FRANCE) Hebdomadaire - 26
décembre 1985 - 2 F. Disponível em:
http://www.alterinfos.org/archives/DIAL-1076.pdf Acesso: 13/12/2013. Grifos são
nossos. Sobre Gonaives, protestos mais recentes (2003) e coincidentemente
também 28 de novembro, levaram a morte pelo menos um estudante, baleado durante
uma manifestação em contra o governo de Aristide. Cf.
http://www.alterpresse.org/spip.php?article924#.Uqskm_RDt64 Acesso: 13/12/2013.
[3] FATTON JR, Robert. Haiti’s
Predatory Republic: the unending transition to democracy. Boulder, Co.: Lynne Rienner Publishers, Inc., 2002 (p.61).
[4] CASTOR, Suzi. Haiti: de la ruptura a la transicoón. Nueva Sociedad
Nro.82 marzo-abril 1986, (p.61-62)