A ditadura cívico-militar de Alfredo Stroessner no Paraguai: memória, cotidiano e setores populares.
Em diversos eventos nacionais e internacionais, uma
das demandas mais cobradas pelos movimentos e organizações sociais refere-se à
criação de políticas memorialísticas sobre o passado autoritário em muitas
sociedades latino-americanas. Em julho de 2013, na XV Cúpula Social do MERCOSUL, realizada em Montevidéu, discutimos a
importância do desenvolvimento de políticas públicas, por parte dos Estados
nacionais, que destaquem os casos de violações aos direitos humanos realizados
pelos governos cívico-militares em nosso continente. Essas discussões foram
realizadas no painel “Educación en Derechos Humanos” e teve a participação de
militantes políticos, de educadores, de juristas e de estudantes dos países
associados ao MERCOSUL.
Já na I Conferência Municipal de Direitos Humanos, realizada em junho de 2015, em Foz do Iguaçu, coordenei um eixo chamado “Direito à memória e à verdade”, no qual discutimos sobre a necessidade da criação, por parte dos órgãos governamentais, de políticas que apurem e esclareçam os casos de violações aos direitos humanos. Além desse ponto, debatemos sobre a necessidade da construção de “lugares de memórias” que destaquem o processo histórico da região, e também sobre a formação de um órgão que questione os patrimônios históricos e culturais que enaltecem a figura dos ditadores e dos torturadores.
Já na I Conferência Municipal de Direitos Humanos, realizada em junho de 2015, em Foz do Iguaçu, coordenei um eixo chamado “Direito à memória e à verdade”, no qual discutimos sobre a necessidade da criação, por parte dos órgãos governamentais, de políticas que apurem e esclareçam os casos de violações aos direitos humanos. Além desse ponto, debatemos sobre a necessidade da construção de “lugares de memórias” que destaquem o processo histórico da região, e também sobre a formação de um órgão que questione os patrimônios históricos e culturais que enaltecem a figura dos ditadores e dos torturadores.
Desde a década de 1990, muitos movimentos sociais
começaram a cobrar do Estado paraguaio o estabelecimento de políticas públicas
referentes às violações aos direitos fundamentais dos seres humanos ocorridas
durante a ditadura cívico-militar de Alfredo Stroessner (1954-1989). Em 1996, o
Congresso Nacional criou a Lei 838, que indenizava as vítimas de violações aos
direitos humanos durante o governo de Stroessner. Outro passo importante foi a
criação da Comisión de Verdad y
Justicia (CVJ), em 2003, legitimada pela Lei 2225. Esse órgão foi formado por setores da sociedade civil, por movimentos sociais
e por líderes políticos e tinha como objetivo central a coleta dos testemunhos
das vítimas do regime stronista e a publicação destes num documento público. Em
2008, foi entregue aos Três Poderes os tomos referentes ao Informe Final da
CVJ.
Em 2014, após sessenta anos da ascensão do General
Stroessner, apresentei a monografia intitulada Cotidiano, memória e política: setores populares e a ditadura
cívico-militar de Alfredo Stroessner
no Paraguai (1954-1989). O principal objetivo do trabalho consistiu na
identificação das formas de resistências cotidianas desenvolvidas pelos setores
populares durante o regime de Stroessner, destacadas pelos tomos III e V do
Informe Final da CVJ. Essa monografia apresentou as ações opositoras das
mulheres, dos camponeses, dos povos indígenas e das crianças.
As ações desses grupos político-sociais foram
“silenciadas” pela historiografia sobre o stronismo. O sentimento de medo, o
sistema assistencialista e os mecanismos desenvolvidos pela ditadura são tidos
como formas de desarticulação política dos setores populares e que levaram ao
apoio incondicional desse grupo ao regime autoritário. Dessa maneira, o
trabalho questionou essa visão tradicional, através da análise de alguns
testemunhos existentes nas fontes. É importante destacar que a monografia apresentou
as resistências cotidianas dos setores populares a partir do âmbito político e
cultural.
Foi na esfera dos
traumas que as mulheres, as crianças, os camponeses e os indígenas começaram a
relatar suas experiências, antes marginalizadas pela historiografia específica
sobre o assunto. Nessas vivências, observamos as memórias sobre o passado
recente e os questionamentos das imagens produzidas pelo governo de Stroessner.
Pensando no cotidiano como um espaço político e cultural, o trabalho concluiu –
embasado nas fontes analisados – que os setores populares foram sujeitos
políticos expressivos durante o governo de
Stroessner e que desenvolveram formas de resistências cotidianas. Numa
sociedade “dominada” pelo sentimento de medo e de impotência, muitos grupos e
muitos indivíduos atuaram politicamente de diversas maneiras, muitas delas não apenas
no espaço público, mas também na esfera do cotidiano/privado.
“Imagem marcante de
crianças em protesto contra Stroessner é parte do acervo do Museu das Memórias”.
Disponível no artigo “No Paraguai, a memória viva da ‘longa e escura noite de
35 anos’”. Disponível em: http://www.adusp.org.br/files/revistas/50/r50a08.pdf. Acesso em 1 jul. 2015.
Paulo Alves Pereira Júnior - Graduado em História - América Latina pela
UNILA e mestrando em História pela UNESP.