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Modernidade e Destruição: Impactos na Mata Atlântica na Região da Tríplice Fronteira


Podemos definir a modernidade como um conjunto amplo de modificações nas estruturas sociais do Ocidente, a partir de um processo longo de racionalização da vida. [...] é um conceito estritamente vinculado ao pensamento ocidental, sendo um processo de racionalização que atinge as esferas da economia, da política e da cultura (SILVA, 2009. p. 297-298).

 

Observamos constantemente o nosso redor. Enxergamos os grandes prédios, carros luxuosos, milhares de ruas e avenidas, invenções maravilhosas que facilitam nossas vidas. Porém, quase que como em segundo plano, um agente secundário, enxergamos a natureza e os pequenos espaços que mesclam-se com o urbano, as praças, os zoológicos, os parques nacionais, que quase sempre são qualificados como locais de lazer, às vezes longe dos grandes centros. Mas por que damos tanta ênfase a estes monumentos “facilitadores” da modernidade? É quase como um esquecimento, negamos os espaços de preservação e cuidado da natureza, que aparentemente ainda não tiveram tempo para que a verdadeira civilização adentra-se.

a eficácia degenerou em dominação, e é atualmente muito criticada por ser responsável pelos estragos ecológicos que o planeta enfrenta, pela desumanização das relações sociais, pela violência e belicosidade entre as Nações, pelo tecnicismo frio da vida moderna, por ter colocado em risco de aniquilamento atômico toda a humanidade (Idem, p. 299). 

 O processo de devastação do meio com a premissa desenvolvimentista é um fantasma que paira no Brasil e na América Latina desde o início de sua colonização, o estudo de Warren Dean (2004) nos conta como o processo de colonização interferiu em diversas esferas sociais, dando um trabalho mais acentuado na devastação da Mata Atlântica a partir dos processos coloniais e como perdemos boa parte de sua extensão original. A primeira fonte portuguesa a chegada do Brasil, a carta de Pero Vaz, nos conta a reação dos portugueses quando desembarcaram no litoral. Ficam abismados com a quantidade quase paradisíaca das florestas atlânticas, uma vastidão e quantidade inimaginável. Sua admiração por esta pequena fração de terra, não os impediu de iniciar um processo de extração do Pau-Brasil em massa, que fomentou a quase extinção da espécie. Por tanto, está em nosso subconsciente histórico, subjugar e extrair da natureza tudo que dela é permitido.

Quando esse processo “civilizador e modernizador” chegar ao seu ápice, ameaçando de fato toda a sociedade, criamos pequenos espaços de preservação e conservação do bioma original, mas são prontamente rechaçados e criticados, porque estes impedem de alcançar a verdadeira modernidade.

Assim como na extração do Pau-Brasil durante as primeiras décadas após a chegada dos europeus, aquele que mais sofreu, além dos milhares de povos originários, foi a Terra, a Mata Atlântica. Esse bioma confecciona boa parte do litoral brasileiro (além de ser partilhado com parte do Paraguai e Argentina), região que mais sofreu  com o contato europeu.

Essa dicotomia entre modernidade e preservação pode ser observada atualmente em boa parte dos grandes centros urbanos brasileiros ao leste do país. As consequências do processo modernizador desenfreado causam dúvidas de como curar essa ferida que não é tratada há séculos. É como colocar curativo em um braço quebrado e acreditar que isso basta para curá-lo. Pelo contrário, cada vez mais iniciamos processos ainda mais devastadores para a Terra e nada se faz para tratá-la.

As consequências dessa modernidade capitalista tem suas raízes dentro da história da colonização, da extração dos recursos naturais, da invasão de territórios e roubo de recursos. Roubo de vida e nós carregamos esses fatos na nossa contemporaneidade, o desprezo pela preservação da natureza, a desenfreada necessidade de mais recursos, independente dos meios utilizados, a extração da vida em nome da modernidade, essa é a nossa herança social da colonização, o domínio do homem sob a natureza.

Estendendo-se mais sobre o processo de civilização e modernidade, a criação das fronteiras dos Estados Nacionais, dificultam ainda mais a implementação de qualquer tipo de ação ou política de preservação. Os governos estão mais preocupados em construir uma economia forte, montar empresas e indústrias que tiram ainda mais os recursos da Terra, em nome da modernização de seus países, consequência direta da visão colonial, do que necessariamente esforçar-se em restaurar este cenário de devastação.

Esses 500 anos de extração de recursos da terra geram situações irreparáveis, não é de hoje que as preocupações com o meio ambiente é tema chave em diversas discussões de governos e cientistas, os grandes centro urbanos deterioram a natureza. Usando novamente a Mata Atlântica como referencial, desde 1500, em torno de 90% de seu território original se perdeu. A cultura da imposição do homem sob a natureza prevalece, o domínio dos recursos e o caminho inevitável para a urbanização e modernização é imposta como pauta.

E a destruição se dá em vários âmbitos, o esquecimento, a negação, a passividade. Todos esses fatores auxiliam a montar uma sociedade que não enxerga aquilo que não quer ver, esquecem os espaços de preservação, as lutas contra a extração desenfreada, negam as mudanças do clima, da qualidade do solo e dos alimentos e permanecem passivas a qualquer tipo de luta ou reivindicação que ocorre por grupos e ativistas. Tudo isso demonstra um plano para permanecermos obsoletos a destruição do nosso planeta e enxergamos como único caminho viável o túnel reto para a modernidade.

 

Referências

DEAN. Warren. A segunda leva de invasores humanos. In.      . A ferro e fogo: a história e a devastação da Mata Atlântica Brasileira. São Paulo. CIA. das Letras. 2004.

 SILVA, Kalina Vanderlei. Dicionário de conceitos históricos. Editora Contexto. São Paulo. 2009.

 

Referência da imagem: Derrubada de uma Floresta (Defrichement d’une Forêt), 1822- 1825, Johann Moritz Rugendas (“Juan Mauricio Rugendas”, Pintor Academicista Alemão, 1802–1858), litografia sobre papel, 21.60 cm x 28.50 cm. In: Enciclopédia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2019. Disponível em: https://institutopoimenica.com/2019/05/15/derrubada-de-uma-floresta-johann-moritz-rugendas/ Acesso em: 02/02/2024

 

Nicollas de Siqueira Kugler, estudante de História, grau Licenciatura, na UNILA

  

 

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