Pular para o conteúdo principal

A violência além da desigualdade e da pobreza.

A desigualdade e a pobreza são constantemente apresentadas como as principais causas da violência na América Latina. Para Beatriz Sarlo, se trata de uma perspectiva adequada, mas incompleta, principalmente quando se pensa no caso argentino, analisado pela autora.
Segundo Sarlo, “apenas” a desigualdade e a pobreza, em si, não explicam o crescimento da violência na Argentina, mas a falta de políticas de combate a ambas, o que desencadearia frustração e falta de perspectivas em amplos setores da sociedade. A respeito da Argentina da década de 1990, destaca: “Para quienes forman parte de la masa de desocupados y subocupados, estabilizada en alrededor del veinticinco por ciento (sin seguro de desempleo), la idea de que la sociedad es un espacio donde hombres y mujeres no están inevitablemente destinados a la frustración y al fracaso es débil y remota.” (2002: 59).
Já falamos como a violência gera uma crise da imagem do Estado como aquele que garantiria a segurança dos indivíduos. Sarlo destaca, ainda, que a violência representa e acentua, ao mesmo tempo, a crise de instituições que representavam espaços de sociabilidade, como a escola, associações de bairro e sindicatos, dentre outros. De acordo com a autora, a crise desses espaços de sociabilidade gera um esvaziamento do espaço público. “La crisis de seguridad afecta e inmoviliza a quienes viven en barrios populares, obligados a garantizar, en todo momento, una presencia en sus casas para evitar depredaciones y robos, y condenados al aislamiento en viviendas donde el equipamiento cultural es mínimo. La movilidad en el tiempo de ocio se reduce y, en consecuencia, también se achican las posibilidades de contacto con otros niveles y consumo sociales.” (2002: 59). Saindo do caso argentino, penso, particularmente, como nós brasileiros, de uma maneira geral, frequentamos pouco espaços públicos como parques e praças, especialmente à noite e, daí, nossa dificuldade em manter estes espaços sem depredações.
Sarlo conclui essa questão da violência e dos espaços de sociabilidade com um argumento interessante. Para a autora, principalmente nas periferias da Argentina, as igrejas evangélicas estariam preenchendo o espaço outrora ocupado pelas instituições que citamos acima. Isso explicaria o crescimento das igrejas evangélicas no país – e na América Latina. “Estas formaciones religiosas, muy numerosas en el conurbano de Buenos Aires, ofrecen lugares de identificación temporal especialmente valorados por quienes no tienen otras opciones de identificación: son tribus culturales organizadas en redes bastante eficaces.” (2002: 61).
Referências bibliográficas:
SARLO, Beatriz. Tiempo Presente: notas sobre el cambio de una cultura. Buenos Aires: Siglo XXI, 2002.
Prof. Paulo Renato da Silva.

Postagens mais visitadas deste blog

A "Primavera dos Povos" na Era do Capital: historiografia e imagens das revoluções de 1848

  Segundo a leitura de Eric J. Hobsbawm em A Era do Capital , a Primavera dos Povos foi uma série de eventos gerados por movimentos revolucionários (liberais; nacionalista e socialistas) que eclodiram quase que simultaneamente pela Europa no ano de 1848, possuindo em comum um estilo e sentimento marcados por uma atmosfera romântico-utópica influenciada pela Revolução Francesa (1789). No início de 1848 a ideia de que revolução social estava por acontecer era iminente entre uma parcela dos pensadores contemporâneos e pode-se dizer que a velocidade das trocas de informações impulsionou o processo revolucionário na Europa, pois nunca houvera antes uma revolução que tivesse se espalhado de modo tão rápido e amplo. Com a monarquia francesa derrubada pela insurreição e a república proclamada no dia 24 de fevereiro, a revolução europeia foi iniciada. Por volta de 2 de março, a revolução havia chegado ao sudoeste alemão; em 6 de março a Bavária, 11 de março Berlim, 13 de março Viena, ...

“Núcleo Integralista, Núcleo Proletário”: Os trabalhadores e os sindicatos no jornal integralista “A Offensiva”

       1.  INTRODUÇÃO      Em outubro de 1932, o político e escritor brasileiro Plínio Salgado (1895-1975) publicou o manifesto que seria a base doutrinária de um dos maiores movimentos político-sociais de extrema direita da América Latina, o Integralismo. Com fortes inspirações fascistas, o movimento logo alcançou um grande número de adeptos e militantes, e marcou os cenários político e social brasileiros da primeira metade do século XX.      Um dos principais meios de propaganda e comunicação da Ação Integralista Brasileira (AIB) foi a imprensa periódica, sobretudo através do jornal A Offensiva, publicado no Rio de Janeiro e distribuído nacionalmente entre 1934 e 1938 (Oliveira, 2009, p. 151).      Através deste texto, considerando A Offensiva como nossa fonte de pesquisa, buscamos analisar criticamente a seção sindical do jornal em três diferentes números publicados entre 03 e 05 de novembro de 1936. Tratam-...